A concessão é um dos mecanismos mais importantes para viabilizar grandes projetos de infraestrutura, permitindo que a iniciativa privada assuma a execução, operação e manutenção de serviços ou empreendimentos públicos por um período determinado.
Esse modelo, amplamente utilizado em setores como rodovias, portos, aeroportos, saneamento e energia, viabiliza investimentos que muitas vezes não seriam possíveis apenas com recursos estatais.
Quando analisada sob a ótica dos contratos FIDIC, um conjunto de modelos contratuais reconhecidos internacionalmente e usados para obras e projetos de engenharia, a concessão ganha um significado ainda mais amplo.
Ela deixa de ser apenas um contrato administrativo e passa a representar uma estrutura complexa que envolve responsabilidades técnicas, obrigações financeiras, gestão de riscos e garantias de desempenho, tudo baseado em padrões contratuais consolidados no mercado global.
O que é concessão?
De forma geral, concessão é o acordo por meio do qual o poder público transfere a uma entidade privada a responsabilidade de executar um serviço ou obra de interesse público, explorá-lo economicamente e mantê-lo em funcionamento, de acordo com condições previamente estabelecidas. O contrato estabelece um prazo definido, ao final do qual os ativos e as operações são revertidos ao poder concedente.
No Brasil, esse modelo é regido principalmente pela Lei nº 8.987/1995, que trata das concessões e permissões de serviços públicos, e pela Lei nº 11.079/2004, que regulamenta as Parcerias Público-Privadas (PPPs). Em outros países, existem legislações específicas, mas a essência da concessão permanece a mesma: permitir que o setor privado financie, construa, opere e mantenha um serviço ou infraestrutura de interesse coletivo.
Concessão no contexto dos contratos FIDIC
Os contratos FIDIC (International Federation of Consulting Engineers) são amplamente utilizados no mundo todo como referência para elaboração de contratos de obras e serviços de engenharia. Sua principal característica é oferecer cláusulas equilibradas que definem com clareza as responsabilidades, riscos e direitos de cada parte envolvida.
Ao aplicar um contrato FIDIC em um modelo de concessão, é necessário fazer adaptações para incluir elementos próprios desse tipo de relação, como:
- Prazos mais longos, que podem ultrapassar 20 ou 30 anos;
- Regras detalhadas sobre tarifas e mecanismos de reajuste;
- Obrigações de manutenção e operação durante todo o período de concessão;
- Cláusulas específicas para resolução de disputas em contratos de longa duração.
No mercado internacional, há modelos FIDIC especialmente adaptados para concessões e contratos BOT (Build, Operate and Transfer) ou DBO (Design, Build and Operate), que compartilham a lógica de transferir a responsabilidade pela construção e operação a um ente privado antes da devolução ao poder concedente.
Características essenciais da concessão
Embora existam variações, toda concessão apresenta elementos centrais que precisam estar refletidos no contrato, especialmente quando se adota um modelo FIDIC:
Transferência de riscos
O concessionário assume riscos relacionados à execução da obra, operação, manutenção e, muitas vezes, à demanda pelo serviço. A correta alocação desses riscos é um dos pilares do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Prazo determinado
A duração do contrato é definida de forma a permitir que o concessionário recupere o investimento realizado e obtenha retorno adequado, sem comprometer a viabilidade econômica do projeto. Ao término, o bem ou serviço é revertido ao poder concedente em condições pré-definidas.
Modelo de remuneração
A receita do concessionário pode vir de tarifas pagas diretamente pelos usuários, contraprestação do poder público, ou uma combinação de ambos. O contrato deve estabelecer com clareza a fórmula de cálculo, a periodicidade de reajustes e os indicadores de desempenho que condicionam o pagamento.
Investimento privado
Em grande parte dos casos, cabe ao concessionário captar e aplicar os recursos necessários para implementar a infraestrutura ou o serviço, assumindo riscos financeiros relevantes.
Etapas de uma concessão estruturada com contrato FIDIC

A execução de uma concessão com base em um contrato FIDIC geralmente segue um ciclo estruturado que garante organização e previsibilidade. Esse ciclo pode ser dividido em cinco fases principais:
1. Planejamento e licitação
O poder concedente define os requisitos técnicos, econômicos e jurídicos do projeto. São realizados estudos de viabilidade e é elaborado o edital de licitação, que inclui as minutas contratuais adaptadas ao modelo FIDIC. Nesta etapa, é fundamental prever a matriz de riscos e as regras para reequilíbrio econômico-financeiro.
2. Assinatura do contrato
Após a seleção do vencedor, o contrato é formalizado, detalhando obrigações, prazos e mecanismos de fiscalização. É comum incluir dispositivos que tratam da governança contratual e da interface com órgãos reguladores.
3. Fase de construção
O concessionário é responsável pela execução das obras de acordo com os padrões de qualidade e os cronogramas estabelecidos. O modelo FIDIC valoriza a função do engenheiro como figura independente, responsável por fiscalizar e mediar eventuais divergências técnicas.
4. Operação e manutenção
Concluída a construção, inicia-se a exploração do serviço, com monitoramento contínuo de indicadores de desempenho. O contrato deve prever mecanismos para corrigir falhas e garantir a disponibilidade e a qualidade do serviço ao longo do tempo.
5. Encerramento e reversão
Ao final do prazo contratual, o concessionário devolve os ativos ao poder concedente, atendendo aos critérios de conservação e funcionamento estipulados. Essa etapa também pode incluir auditorias técnicas e financeiras.
Vantagens de usar contratos FIDIC em concessões
A adoção dos contratos FIDIC em projetos de concessão oferece benefícios relevantes:
- Clareza e padronização: Os modelos FIDIC trazem uma estrutura lógica e clara, com linguagem reconhecida internacionalmente, o que facilita a compreensão por todas as partes;
- Equilíbrio na alocação de riscos: A filosofia FIDIC busca distribuir riscos de forma justa, atribuindo-os à parte mais capaz de gerenciá-los;
- Mecanismos de resolução de disputas: Incluem instâncias como Dispute Boards e arbitragem, que ajudam a evitar litígios prolongados;
- Reconhecimento global: Por serem amplamente utilizados, inspiram confiança em investidores e financiadores internacionais.
Desafios e cuidados necessários
Apesar das vantagens, a aplicação de contratos FIDIC em concessões exige atenção a alguns desafios:
A primeira questão é a adaptação às legislações locais. O modelo padrão FIDIC precisa ser ajustado para incorporar requisitos legais do país ou região, incluindo normas sobre contratação pública, garantias e limites tarifários.
Outro ponto crítico é a definição de indicadores de desempenho para contratos de longo prazo. É preciso criar métricas que sejam objetivas, mensuráveis e ajustáveis ao longo do tempo, evitando distorções.
É necessário prever garantias financeiras robustas, como seguros de performance e fianças bancárias, para reduzir riscos de inadimplência ou descumprimento contratual.
Diferença entre concessão e outros modelos de contratação
É comum confundir concessão com empreitada, PPPs ou arrendamento, mas existem diferenças claras:
- Na empreitada, o contratado entrega a obra pronta, sem responsabilidade pela operação ou manutenção;
- Nas PPPs, há uma divisão mais equilibrada de responsabilidades e investimentos entre poder público e privado, com contratos frequentemente mais curtos que as concessões plenas;
- O arrendamento envolve a cessão do uso de um bem, mas sem transferir ao arrendatário a obrigação de investir em melhorias ou manter a operação nos moldes exigidos em uma concessão.
O papel das partes no contrato de concessão FIDIC
Em um contrato de concessão estruturado com base no FIDIC, cada parte desempenha funções específicas e críticas para o sucesso do projeto.
O poder concedente é responsável por definir as regras do contrato, fiscalizar a execução e garantir que o equilíbrio econômico-financeiro seja preservado. Ele atua como regulador e como garantidor das condições contratuais.
O concessionário assume os riscos operacionais e financeiros, executa as obras, opera o serviço e busca eficiência para cumprir as metas de desempenho e obter retorno sobre o investimento.
O engenheiro é a figura central no modelo FIDIC, atuando como um terceiro independente que fiscaliza, emite certificados de pagamento, decide sobre disputas técnicas e garante que as partes cumpram suas obrigações.
Importância estratégica da concessão no desenvolvimento de infraestrutura
As concessões representam uma ferramenta estratégica para ampliar e modernizar a infraestrutura de um país. Elas permitem alavancar investimentos privados, acelerar a entrega de serviços essenciais e transferir know-how operacional para o setor público.
Ao utilizar contratos FIDIC, a gestão dessas concessões ganha em transparência, previsibilidade e padronização, elementos que são valorizados tanto por órgãos reguladores quanto por financiadores internacionais.