A Administração Contratual é definida como o conjunto de técnicas, processos e boas práticas que acompanham todo o ciclo de vida de uma obra. Sua função primordial é ser o fio condutor do negócio de engenharia, percorrendo e integrando toda a execução do objeto.
A gestão de contratos visa a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro contratual. O princípio central da AC é cumprir com os deveres, prevenir-se e resguardar os direitos.
Os propósitos essenciais da Administração Contratual incluem:
- Maximização do valor dos contratos.
- Controle de riscos.
- Controle de custos.
- Cumprimento de prazos.
- Controle de Qualidade.
- Melhoria na colaboração e comunicação.
Para garantir a preservação do lucro, a AC deve atuar de forma completa, desde a formalização até a entrega final, por meio de ações estruturadas nos eixos Preventivo, Proativo e Reativo.
Administração Contratual Preventiva: Redução de Incertezas
A atuação preventiva representa a Administração Contratual Preventiva, caracterizada pela alta interação entre as áreas. Seu objetivo é antecipar e clarificar situações futuras para a estabilização do negócio de construção.
O modelo de AC Preventiva resulta na preservação do relacionamento, na manutenção da lucratividade e no cumprimento do Contrato. Essa abordagem difere da Administração Contratual Antiga, que é reativa e de baixa interação, resultando em aumento de passivos e redução da lucratividade.
A prevenção começa na fase Antes do Contrato (análise do edital, elaboração da proposta). Durante a execução, a prevenção é centrada na gestão efetiva da Tridimensão Contratual:
| Ordem | Descrição e Foco | Risco de Perturbação |
|---|---|---|
| Física (Área) | Refere-se à total disponibilidade da área liberada e em condições adequadas para a implementação da obra. Exige licenças, autorizações e mapeamento de interferências. | Falta de liberação de áreas impede o desenvolvimento da produção nos modos e tempos contratados. |
| Técnica (Projeto) | Concerne ao fornecimento de projetos de engenharia corretos, completos e dentro do prazo pactuado. | Inconsistências ou atraso na entrega de projetos podem gerar retrabalhos e quebra da sequência executiva. |
| Econômica (Preço) | Compete aos preços e quantidades previstos no Contrato, que devem ser suficientes e adequados para a remuneração dos serviços. | Valores ou quantidades insuficientes comprometem o fluxo de caixa e limitam a normal fluência das atividades. |
A perturbação de qualquer ordem da Tridimensão pode desencadear perdas de produção, quebra da sequência executiva, ocorrência de retrabalhos, extensão de prazo da obra e comprometimento do caixa da obra.
Ações Preventivas Iniciais:
- Elaborar a Análise Inicial do Contrato e seus anexos, dando visibilidade aos principais riscos, pontos de atenção e oportunidades.
- Compreender todo o escopo, frentes de trabalho, obras de arte, prazos e preços, tendo domínio das informações relevantes.
Administração Contratual Proativa: Acompanhamento e Documentação Qualificada
A postura proativa se manifesta no acompanhamento completo e contínuo do contrato. O objetivo é evitar que pequenos desgastes evoluam para entraves maiores. A Administração Contratual atua em todas as etapas do Ecossistema do Contrato, que incluem orçamento, mobilização, controle de qualidade, planejamento, medição, produção, QSMS (Qualidade, Segurança, Meio Ambiente e Saúde) e desmobilização.
Rotina de Acompanhamento e Monitoramento
A equipe de AC deve ter uma rotina de monitoramento das pendências, com frequência mínima semanal ou quinzenal.
| Ação Proativa | Frequência | Foco na Tridimensão |
|---|---|---|
| Verificação da Tridimensão | Semanal, no mínimo | Mapear pendências da Contratante (áreas livres, projetos liberados, preços/quantidades suficientes) para justificar desvios ou reequilíbrios. |
| Registro de Pendências | Quinzenal | Inserir registros das pendências identificadas em documentos bilaterais, como a Carta de pendências. |
| Acompanhamento de Progresso | Quinzenal | Conferir o avanço real versus contratado do cronograma físico, histogramas (MOD, MOI, EQP) e cronograma físico-financeiro. |
| Verificação de Eventos Geradores de Desequilíbrio | Quinzenal | Iniciar a reivindicação caso identifique eventos que possam gerar desequilíbrio. |
| Análise de Projetos/Serviços Novos | Quinzenal | Verificar a existência de serviços novos a partir da análise crítica de projetos ou reportes de campo (CTE, SIT, PDI) para iniciar um pedido de preço novo. |
| Acompanhamento da Produtividade | Mensal | Acompanhar se há perda de produtividade dos recursos mobilizados para iniciar uma reivindicação. |
O Registro Qualificado e a Pirâmide de Dutra
É fundamental que tudo seja registrado. O registro deve ser feito de forma contemporânea à ocorrência dos eventos, pois, caso contrário, perde o valor ou se torna impossível de ser feito.
O Relatório Diário de Obra (RDO) é um instrumento de controle, acompanhamento e registro formal. Ele serve como base para análises, medições, comprovações e eventuais defesas. Contudo, a AC Proativa entende que o RDO é apenas uma ferramenta básica de registro e não deve ser o único local de formalização.
O problema hoje na construção civil não são as paralisações pontuais, mas sim a improdutividade causada por revisões de projeto de última hora, atraso na liberação de área e interferências. Fatos sistêmicos exigem um encadeamento de registros em todo o sistema de gestão.
A Pirâmide de Dultra demonstra que o registro deve descer para as camadas de documentos de engenharia para evitar a “zona de guerra de registros”:
- Evitar RDO/Cartas (Documentos Interpretáveis): Evitar a repetição excessiva de registros genéricos como “aguardando projeto”. O RDO deve ser preenchido de forma objetiva, focando em área, preço e projeto.
- Priorizar Documentos de Engenharia (Camadas 3, 4 e 5):
- Ordem Técnica: Usar a Lista Mestre de Projetos (para rastrear revisões e datas de recebimento), e Consultas Técnicas (SIT/NAP) para dúvidas ou inconsistências, buscando respostas formais da Contratante.
- Ordem Física: Utilizar Termos de Liberação de Área, Relatórios Topográficos, e Mapas Lineares/Retigráficos para mostrar trechos impedidos.
- Ordem Econômica: Formalizar serviços adicionais através de Solicitações de Mudança (SM), Ordens de Item Novo (OIN) ou aditivos contratuais, definindo custo e prazo antes da execução.
Gestão do Relacionamento e do Conflito
A manutenção da boa relação entre as partes requer uma comunicação clara e aberta, estabelecendo uma via de tratativas e negociações eficaz para a resolução ágil de problemas.
A leitura do comportamento e dos sinais da outra parte é crucial para definir a estratégia de comunicação. O Administrador Contratual deve manter a relação o mais próxima possível do estágio “Fácil” no destilador de conflitos (onde atritos são rotineiros e as partes negociam tecnicamente), evitando a escalada para estágios de Crise (conduta destrutiva, multas, bloqueio de pagamentos).
Assuntos sensíveis (serviços adicionais, ociosidade, impactos) devem ser tratados durante a execução do contrato, com suporte documental adequado (ofício, e-mail técnico, ata de reunião).
Administração Contratual Reativa: Elaboração de Pleitos (Claims)
Quando um evento impactante altera as premissas contratuais, a gestão torna-se reativa, focando no reestabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro. Um Claim (Pleito ou Reivindicação) é o instrumento que busca essa alteração no contrato por fatores financeiros, prazos ou escopo.
Causas e Etapas do Pleito
As principais causas de Claims geralmente estão ligadas às variações na Tridimensão Contratual (Área, Projeto e Preço). Problemas recorrentes incluem:
- Projetos: Atraso na entrega e alterações/revisões após o início da execução, causando improdutividade e deslocamento do cronograma.
- Áreas: Não liberação da área no tempo oportuno (falta de licenças, desapropriações).
- Variação de Quantitativo: Aumento ou redução devido a alterações de escopo ou metodologia.
- Chuvas Extraordinárias: Volume maior que o previsto ou deslocamento das atividades para o período chuvoso devido a outros atrasos.
- Atraso de Pagamento: Não cumprimento das condições contratuais, podendo gerar custos adicionais e atualização monetária (IPCA, INCC, etc.).
As etapas do Pleito envolvem:
- Estudo e Elaboração: Levantamento e consolidação das informações.
- Protocolo: Apresentação formal ou informal ao cliente.
- Negociação: Troca de análises técnicas e comerciais, buscando um acordo.
Estrutura do Documento e Nexo Causal
A estrutura básica para a elaboração do Pleito segue quatro seções principais:
- Fundamentação (Indicadores): Narração histórica, principais marcos contratuais e eventos marcantes. Demonstração dos indicadores (comparativo entre previsto e realizado para MOD, faturamento, prazo, avanço físico).
- Exposição dos Fatos (Evento): Descrição detalhada do evento ocorrido, utilizando documentos comprobatórios, preferencialmente bilaterais.
- Estudo do Impacto e Responsabilidades: Estabelecimento do Nexo Causal, que é o vínculo fático que liga a causa (evento) ao efeito (custo adicional ou impacto no prazo).
- Quantificação das Consequências: Mensuração financeira do desequilíbrio.
O Pleito deve ter uma fundamentação técnica robusta, e a apresentação de itens sem o mínimo nexo causal pode prejudicar a negociação dos itens mais fortes. A documentação anexa deve ser disponibilizada no protocolo.
Metodologias de Análise de Impacto (AACE)
Para comprovar o impacto em prazo e produtividade, utilizam-se metodologias reconhecidas internacionalmente pela AACE International (Association for the Advancement of Cost Engineering International). O objetivo é reduzir a subjetividade e aumentar a transparência dos procedimentos analíticos.
A. Análise de Produtividade (AACE n° 25R-03):
A perda de produtividade é a relação entre o output (produção) e o input (recursos), afetando custos e prazos.
- Measured Mile (Método da Milha): Baseia-se na comparação entre períodos ou atividades impactadas e aquelas sem interferências (período de produtividade normal). É um método de alta aceitabilidade em disputas legais e fundamentado em dados reais do projeto. A produtividade normal é o valor mais alto ou a média dos períodos não impactados. É usado para calcular a perda percentual de produtividade e quantificar o custo adicional.
- Análise de Valor Agregado (EVA – Earned Value Analysis): Avalia o desempenho comparando o trabalho realizado (EV) com o trabalho programado (PV) e os custos efetivos (AC). Permite estimar o impacto de ineficiências quando há informações insuficientes sobre unidades físicas instaladas.
B. Análise de Cronograma (AACE n° 29R-03):
A análise busca entender as causas e responsabilidades por atrasos. Os atrasos são classificados como:
- Não Justificáveis/Não Compensáveis: Responsabilidade da Contratada (ex: falta de mão de obra, clima normal).
- Justificáveis/Não Compensáveis (END): Força maior (greves, chuvas extremas) ou atrasos concorrentes. Dá direito à prorrogação de prazo, mas sem compensação financeira.
- Justificáveis/Compensáveis (ECD): Inteira responsabilidade da Contratante. Dá direito à extensão de prazo e compensação financeira.
C. Métodos de Análise de Cronograma (MIPs):
- Método Modelado ou Aditivo (MIP 3.6): É um método de simulação que insere eventos de atraso (fragnets) em um cronograma de referência (linha de base) para avaliar o impacto no prazo final. Permite identificar atrasos críticos e determinar a extensão justificada do prazo. É utilizado em análises prospectivas e retrospectivas.
- Método Observacional Total (MIP 3.1): Compara a linha de base com o cronograma executado (as-built) ou a última atualização, sem fazer modificações estruturais. Útil para análises estáticas e globais.
Quantificação dos Custos Adicionais
O melhor método de cálculo é aquele que reflete a realidade do contrato e os indicadores existentes.
1. Custos de Acréscimo de Prazo (Extensão)
Envolve a permanência adicional de estruturas diretas e/ou indiretas.
- Custos Indiretos (BDI): Calculado devido à extensão do prazo, que exige permanência adicional de custos fixos (Administração Central, Seguros, Garantia, Lucros). O cálculo diário do Custo Indireto Contratado é fundamental para quantificar o gasto durante o período paralisado.
- Custos Diretos (MOD e Equipamentos): Cálculo da ociosidade referente ao tempo em que a mão de obra e os equipamentos ficaram mobilizados em campo, mas impossibilitados de uso (idleness). Baseia-se na CPU e nos histogramas mobilizados, aplicando-se os encargos sociais no caso da mão de obra direta.
2. Custos por Redução de Escopo
Quando o escopo é reduzido, é necessário calcular os custos de Administração Local e Indiretos não Remunerados, pois esses custos fixos foram totalmente incorridos, mas não foram pagos em sua totalidade devido à redução.
3. Realinhamento de Preços
É um instituto excepcional, diferente do reajuste (que corrige a inflação ordinária por índices) e da repactuação (para mão de obra em serviços contínuos). O reequilíbrio corrige a ruptura da equação contratual causada por eventos imprevisíveis, ou previsíveis, mas de consequências incalculáveis (álea extraordinária, caso fortuito, força maior, fato príncipe).
- Pressupostos: Fato gerador superveniente à proposta, caráter extraordinário da causa, nexo de causalidade e comprovação técnica.
- Cálculo: Não há metodologia única, mas geralmente se baseia na apuração do peso do insumo sobre o serviço, seguida da apuração da variação do preço (preferencialmente por tabelas referenciais como SINAPI e SICRO, que são idôneas e afastam falhas de orçamento).
Resolução de Conflitos e Disputas
Quando as negociações do Claim não resultam em acordo, a controvérsia pode escalar para métodos formais de resolução de disputas. Estes são classificados em:
| Tipo de Método | Característica | Exemplos |
|---|---|---|
| Autocompositivos | Solução construída pelas próprias partes. Menor desgaste e menor poder de decisão. | Negociação, Conciliação, Mediação. |
| Heterocompositivos | Contam com um terceiro imparcial com poder decisório. Maior poder de decisão e maior desgaste. | Dispute Board, Arbitragem, Jurisdição Estatal (Justiça Comum). |
A Arbitragem é um método privado, onde árbitros resolvem o conflito com força de decisão judicial. O Dispute Board é um comitê técnico que atua de forma preventiva e resolutiva durante o contrato.
Em disputas, o Assistente Técnico (contratado pela parte) atua como especialista, ajudando o advogado a sustentar a tese técnica e elaborar pareceres consistentes, enquanto o Perito (nomeado pelo juiz/árbitro) atua de forma isenta para auxiliar o julgador. A consistência técnica do parecer do Assistente Técnico pode, inclusive, prevalecer sobre o laudo do Perito.


